'Furiosa' é tudo que precisamos ver no cinema quando o assunto é raiva feminina
- Sâmya Mesquita
- 1 de jun. de 2024
- 2 min de leitura

Eu preciso dizer que assistir “Furiosa” mexeu com uma parte de mim muito profunda, que é a raiva. Sempre foi ensinado para as mulheres - e as produções cinematográficas reforçavam muito isso - que não temos direito à fúria. E comigo não foi diferente. Só no final dos anos 1990 que essa representação passou a ser presente na sétima arte, mas ainda bem caricaturada. Isso porque a raiva feminina era apresentada ao público através de diretores homens. E basicamente, é apenas uma cópia da raiva masculina, repleta de violência e gritos.
Não digo que não tenhamos nossos momentos de gritos. Estamos à mercê do que nos impõem. Mas eu sei e você sabe que a raiva feminina é muito mais calculista e friamente medida. Nós não explodimos como bárbaros de Dungeons & Dragons: nós planejamos e executamos vingança, quando necessário. E é isto que "Furiosa" nos traz.
A protagonista é retirada do seio da família e de sua mãe, passa por uma série de violências, é vendida e come o pão que o diabo amassou. Ela tem anos para calcular sua vingança contra todos que lhe fizeram mal. E a cada momento em que ela mal fala - são apenas 30 falas ao longo do filme -, você sabe que ela está ardendo em fúria.
A própria Anya Taylor-Joy, que interpreta Furiosa, disse em entrevista que lutou para incluir a verdadeira raiva feminina no filme - inclusive, dirigido por um homem. E esta veia interpretativa traz uma dramaticidade ainda maior para a saga. Tanto que, no final, não importa tanto o processo de execução da vingança. As 2 horas e 30 minutos de filme passam voando!
O filme não é perfeito: tem algumas incongruências narrativas, como o fato de Furiosa deixar o cabelo crescer quase como quisesse ser descoberta. Por que não deixou o cabelo curto, como já estava antes? E como ela o corta duas vezes, parece um exagero do uso daquele recurso simbólico usado em várias produções asiáticas: cortar o cabelo é o marco de uma mudança significativa na vida de uma mulher. Mas isso não é nada comparado à linearidade da obra.
Chris Hemsworth também é um ponto alto da história: não lembro de um vilão de um blockbuster recente tão carismático e complexo! O ursinho que ele usa, preso a correntes, me deu agonia pelos motivos errados e só depois entendi o significado de sua própria perda.
As falas também são profundas, shakespearianamente elaboradas, com camadas tão complexas que ainda preciso assistir uma outra vez para acessar. E apesar de ser um filme repleto de ação, não se torna cansativo.
Vale ressaltar que há uma cena que vai arrancar suspiros dos fãs mais antigos da saga. E o final... É tão esperançoso quanto triste porque sabemos onde tudo vai parar.
Em suma, é um dos melhores filmes de grande orçamento que vi nos últimos tempos. E espero que possamos ver mais produções que explorem o que, para mim, é a verdadeira raiva feminina.
NOTA: 4/5
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